sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Diálogo.....




DIALOGO (não concluído) ENTRE UM INDIO MAPUCHE, E UM MOTORISTA DE TAXI.

Nota de cheo-andino: Hoje estarei traduzindo e resumindo do meu jeito simples e da maneira mais adequada, para interpretar opinião do jornalista e autor Pedro Cayuqueo, Diretor do diário Mapuche Azkintuwe (Mapuche é uma raça de índios do Chile).
Aeroporto de Maquehue; após duas semanas fora do Chile, o avião aterriza na cidade de Temuco, chove muito; más quase todo o tempo é assim mesmo.
Pego um radio-taxi e peço para me levar até o centro da cidade
“Esta muito ruim este nosso clima”... somente o seu vôo que pode aterrizar; falou o taxista. Tentando começar uma conversa com seu provavelmente primeiro cliente do dia. Não pense que é só aqui, fui respondendo. No lugar de onde venho, eu suava a toda hora... até estava com saudades da chuva e o frio daqui.
Com ar de dúvida pergunta de onde é que estou chegando. Da Bolívia mais precisamente de “Santa Cruz”.
Ah!...da Bolívia, olha é por lá que tem um índio presidente, né?- aquele que esta de brincadeira com esse assunto da saída para o mar?
E o que você acha do Evo Morales? Pergunta-me. Então começo a explicar que na Bolívia existem diferentes idéias sobre a sua pessoa e sua presidência, mas; quando a ponto de emitir minha opinião, ele me interrompe de diz:
Olha... por aqui em Temuco também temos uns índios que estão todos os dias aprontando, invadem terras, fecham estradas, arrumam brigas com a policia, e isso que é gente desocupada, né. E, se entregassem as terras para eles, não saberiam o que fazer com isso. É o mesmo que entregar uma locomotiva para crianças dirigir! Esta gente (os índios) nunca tem trabalhado, ele tem preguiça por natureza.
Já se passaram cinco, dez, quinze minutos e o motorista do táxi aumentava os argumentos para denegrir a imagem Mapuche, eu tento em vão intervir nos comentários, mas; o estado crítico tomou conta dele, na chegada e antes de dar a última freada, olhou para mim de falou indignado: Já é hora de eles pararem!
Chegamos. Quanto custa?
Senhor são três mil pesos. Cavalheiro muito obrigado, e fique com meu cartão para a próxima!
Entro em casa e respiro fundo.
Pois já se passaram alguns dias e a conversa no táxi não me deixa em paz, não estou tranqüilo; não que aquele homem fosse um neonazista “crioullo”, nada de corvos tatuados no braço, nem hinos marciais Alemães. Mas tinha sim, ao lado do retrovisor a Virgem do Carmo, também fotos de crianças que pela idade seriam seus netos, no parabrissas um adesivo desgastado do Esporte Temuco. Lembro o taxista de pele mais escura que muitos Mapuches, um mestiço por muitas gerações; o chileno simples, comum, orgulhoso de sua família que ainda pela sua idade um esforçado trabalhador.
Onde localizar as origens de tanto racismo, na sua educação? No seu meio social? Experiências de vida?...Ou nos meios de comunicação?
Ele não é o único, com certeza! Suponho que dezenas, centenas, milhares de pessoas iguais a ele circulem pelas ruas de Temuco e arredores. Não são pessoas perversas, e sim Esquizofrênicas, não sou eu quem afirma, senão os resultados de pesquisas, senão vejamos:
- Considera você que o Estado está em dívida com o povo Mapuche resposta: Sim 82%
-Considera você que o governo deveria tomar medidas mais drásticas com os ativistas Mapuches, resposta: Sim 76%.
-Deveria o governo aplicar a Lei anti-terrorismo nos ativistas Mapuches, resposta: Não 67%.
(pesquisa do diário “La Tercera, em setembro de 2008)”.
Analise: Sim, Sim; mas, Não.
Não, Não; mas, Sim.
Isto é uma discriminação com jeitinho Chileno. O quê fazer ao respeito?Ir para a ofensiva?. A cada insulto responder com outro de maior escalão e medida. Já acreditei que esse deveria ser o caminho a ser seguido; eu reconheço ter pensado assim; mas essa idéia foi embora faz muito tempo. Temos mais é que insistir nas oportunidades que nos outorga o dom da palavra, ou nas letras como agora é o caso. Quanta vontade eu tive de chamar o taxista feito um Barack Obama, no pátio da Casa Branca; colocar as nossas diferenças numa boa, junto a uma rodada de cervejas; explicar-lhe; que o meu “bisavô”, o “Lonko” Luis Millaqueo, nasceu num País Mapuche, livre e independente; quando Chile aqui não era o Chile, e Temuco era apenas uma palavra a mais da nossa língua indígena. Contar-lhe que meu bisavô era o quarto filho de uma família de prósperos comerciantes de gado no “Vale do Cautin”, e que após a invasão chilena, foi cercado e isolado junto de sua gente; e que o exercito após despojar-lhe as terras tirou também os seus cavalos que negociava desde os seus 25 anos de idade, nas tropearias que iam até “Puelmapu” as terras Mapuches do lado Leste, na cordillera; hoje cidade de Neuquén pertencente à República Argentina.
Contar que os milhares de hectares de terras que meu bisavô tinha, foram reduzidas para 340 miseráveis hectares, ainda que historicamente constem no “Titulo de Merced” aprovado no ano de 1.904, E foi isso que legalizou o a desapropriação, o saque e a miséria aos que sobreviveram à derrota. Sem eufemismos, aqueles retalhos de terras foram denominados de “Redutos” pela Lei chilena, foram criados mais de dois mil. Muito bem sabido pelo Ministro do interior, sr. Edmundo Perez Yoma e que às vezes utiliza esses números para minimizar a quantidade de Mapuches mobilizados no Sul, que segundo ele “são tão somente duas ou três comunidades, entre um grupo de duas mil, que tem seguido o rumo da violência”.
Contar ao taxista que o que Perez Yoma denomina de comunidades, são redutos onde aqueles Perez Yoma de antigamente, trancaram gente que nem meu bisavô com seus parentes; comunidade que nos falamos até esquecemos que foram e tal vês continuem sendo escuros campos de refugiados.
Contar também que após a morte de meu bisavô, o meu “chedki” (avô materno), assumiu o cargo de Lonko, herdando não apenas o cargo, mas também a de ser um camponês pobre. Meu avô passou grande parte de sua vida (76 anos) percorrendo Juizados e órgãos de serviços Públicos; mesmo sem saber ler nem escrever, tomado por um câncer morreu com a tristeza de ser pobre e discriminado. Da mesma maneira que seu pai, meu avô tentou recuperar aquilo que lhe pertencia e lhe foi tirado, queria projetar um futuro aos seus 13 filhos, sem conseguir nada e o esforço arranco-lhe a vida.
Contar que Jacinta a mais velha de suas filhas era seu xodó, a mais mimada, e sofreu muito quando aos l7 anos ela decidiu ir à capital Santiago, para estudar e trabalhar. Gostaria de contar ao taxista que a jovem culta e bonita, Jacinta viria a ser minha querida mãe; esta mesma que não duvidou ao decidir largar uma bolsa de estudos lá nos Estados Unidos, para ficar trabalhando de doméstica, de sol a sol. A única maneira de ajudar na educação dos seus irmãos. Foi assim que conheceu e namorou meu pai, que na primeira oportunidade retornam ao Sul, e nos anos setenta nasceram: Maria Elena, Alejandra, e o passageiro que naquele dia chuvoso embarcou no aeroporto.
Maria Elena mora em Londres, faz 15 anos. Alejandra, a queridinha do papai, hoje é destaque doutorando no campo da medicina; e aquele seu passageiro, transita hoje pela vida como jornalista e homem de comunicação.
Penso eu, se é possível que pela dolorosa historia que hoje comparto com você, possa respeitar-me, lhe convido para conviver em paz e tratarmos de igual para igual.
Nos dois adoramos os nossos filhos, os dois desejamos o melhor para nossas famílias, também nos dois gostaríamos de viver numa terra de paz, inclusive nos dois torcemos para que o Deporte Temuco tenha uma boa temporada. Então existe a possibilidade de botar acento naquilo que no une? E não nas coisas que nos fragmentem.
Não responda de imediato, contem-me primeiro sobre você, dos seus pais, seus avôs, gostaria saber parte de sua historia, atreva-se e não sinta medo; porque as próximas cervejas saem por minha conta; eu lhe diria.
DIALOGO (não concluído) ENTRE UM INDIO MAPUCHE, E UM MOTORISTA DE TAXI.

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